O que é o projeto


O projeto Água para o Futuro é uma iniciativa do Ministério Público do Estado de Mato Grosso, executado em conjunto com o Instituto Ação Verde e a Universidade Federal de Mato Grosso. O projeto busca, prioritariamente, garantir a segurança hídrica de Cuiabá e o abastecimento de água potável por meio da identificação, preservação e recuperação das nascentes. Com esse desiderato, equipes técnicas formadas por geólogos, hidrogeólogos, engenheiros florestais, engenheiros sanitaristas, biólogos, especialistas em sensoriamento remoto, entre outros profissionais, realizam trabalhos de campo, análises, pesquisas e atividades científicas diversas (identificação, caracterização, monitoramento etc.) vinculadas ao projeto,  previstas no seu plano de ação.

Objetivo geral

Identificar, caracterizar, monitorar, preservar e recuperar as nascentes urbanas do Município de Cuiabá.

Objetivos específicos

  • Mapeamento georreferenciado das nascentes urbanas de Cuiabá;
  • Localização e caracterização fisiográfica das nascentes;
  • Caracterização físico-química e biológica atual das nascentes;
  • Identificação da origem das águas exfiltradas;
  • Delimitação física da bacia de drenagem a montante da nascente e dos caminhos preferenciais de escoamento (talvegue), com a respectiva área impermeabilizada;
  • Determinação do número mínimo de parâmetros ambientais indicadores de nascentes descaracterizadas;
  • Diagnóstico dos impactos ambientais;
  • Criação de um banco de dados (post gree), plataforma Geocloud, contendo informações atuais e pretéritas sobre as nascentes e as ações do projeto, para disponibilização aos partícipes e parceiros;
  • Inserção de marcos de referência definindo o local exato da surgência;
  • Criação de uma zona tampão de proteção delimitada em torno das nascentes;
  • Monitoramento;
  • Sensibilização ambiental;
  • Interação com a comunidade, mediante disponibilização das informações e ações, via página na internet e aplicativo para smartphone;
  • Proteção e recuperação das nascentes, inclusive por intermédio de parcerias com a iniciativa privada;
  • Responsabilização criminal e cível dos poluidores.

Justificativa

A água é um bem de domínio público e a gestão dos recursos hídricos deve contar com a participação do Poder Público, dos usuários e das comunidades (Lei n. 9.433/1997). Cuiabá é um município privilegiado, que comporta um sistema superficial de abastecimento (fio d'água), não sendo necessária a construção de represas (lagos de inundação) para o abastecimento. No entanto, para que haja eficiência na oferta de água, é necessário que as nascentes e os corpos hídricos existentes no município estejam íntegros.

Hidrografia da zona urbana de Cuiabá

Levantamentos prévios feitos pelo projeto já demonstram degradação em quase todas as nascentes existentes na área urbana de Cuiabá. Além da retirada da mata ciliar, a destinação inadequada de efluentes e a ausência de proteção física nos pontos de afloramento de água contribuem substancialmente para o esgotamento deste recurso, ou até mesmo para a inutilização do corpo hídrico, devido à alta concentração de  poluentes.

A ineficiência ou a omissão do município no exercício de seu poder-dever de polícia - ao qual cabe fiscalizar as ocupações irregulares de áreas ambientalmente protegidas, inclusive nascentes -, a poluição e o uso irracional e clandestino da água causam interferências na disponibilidade do recurso natural e desequilíbrio na distribuição.

Com a frequente degradação das nascentes e com o risco de o abastecimento de Cuiabá ficar comprometido - num futuro bem próximo -, as equipes estão identificando e caracterizando as nascentes da área urbana. Cada equipe segue um procedimento padrão, predefinido.

Procedimentos

O projeto Água para o Futuro possui quatro equipes de profissionais responsáveis pelos estudos ambientais das nascentes urbanas de Cuiabá. São elas: Geologia, Hidrogeologia, Fauna e Vegetação. O projeto também envolve profissionais de diversas áreas da tecnologia para o armazenamento e processamento de dados geográficos, desenvolvimento do site e aplicativo para smartphone (com o apoio do Departamento de Tecnologia da Informação do Ministério Público de Mato Grosso), filmagens aéreas em alta definição, utilização de veículo aéreo não tripulado (VANT), para monitoramento, inspeções e perícias, confecção de mapas, entre outras funções.

Geologia

Levantamento prévio das nascentes

A conceituação das nascentes e de sua tipologia é feita a partir da literatura sobre o tema e dos dados existentes coletados e à disposição do projeto Água para o Futuro; dentre eles, estudo de 2008, encomendado pelo Município de Cuiabá, denominado “Caracterização e delimitação cartográfica das áreas de preservação permanente (APPs) e de zonas de interesse ambiental (ZIAs) na área urbana de Cuiabá”, desenvolvido pelo Instituto de Pesquisas de Mato Grosso (IPEM) e executado pelo Grupo de Pesquisa Cartografia Geotécnica e Dinâmica Superficial da UFMT.

Validação das nascentes em campo

Foi utilizado receptor GPS Monterra Garmin para a navegação até os pontos definidos pelo IPEM e outros levantados pelo CAOP, 17ª Promotoria de Justiça. Os pontos foram inspecionados ao longo do ano hidrológico no intuito de se compreender a influência da sazonalidade na exfiltração de água local. A compreensão da dinâmica hídrica por meio de observações, realizadas tanto no período da seca quanto no período chuvoso, se faz imprescindível para a determinação do momento de excesso hídrico do aquífero ao qual cada nascente está associada, uma vez que neste momento se observam as maiores vazantes. As nascentes, quando localizadas, são georreferenciadas com um receptor GPS Juno Trimble SB, de alta precisão, e as coordenadas são corrigidas pelo software GPS Pathfinder Office 4.2 e importadas para um banco de dados geográficos Personal Geodatabase.
 

Caracterização da condição ambiental

São realizados registros das condições ambientais de cada nascente: distância média de edificações, tipo de nascente, tipo de canal, aspecto físico da água (a olho nu), aspecto do entorno imediato (raio de 50 m), tipo de solo e/ou cobertura, presença de processos erosivos (entorno de 50 m), assoreamento significativo etc.

Análises de solo

É realizada coleta de solo com trado manual para observação (em campo) dos processos de hidromorfismo de plintização e gleização do solo, e outros que indiquem proximidade e/ou oscilação do nivel d'água subterrêneo.

Coleta do solo nas nascentes

Análises de água

A detecção de possíveis contaminações por metais pesados é realizada por meio de análises geoquímicas do material precipitado da amostra, pelo método ICP do Laboratório de Engenharia Química, na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).

Imageamento de alta resolução para confecção de mapas

Foram utilizadas as imagens de 1966, 1983 e 1998, em tons de cinza. Imagens digitais provenientes de levantamento aéreo correspondem ao ano de 2005. As imagens de satélite de alta resolução espacial foram consultadas a partir da base de imagens da plataforma Google Earth PRO, dos anos de 2004 a 2016.

Instalação do marco geodésico

É realizado por topógrafo habilitado, com acompanhamento do coordenador da equipe de geologia, após confirmação da nascente pelos cientistas. O levantamento de campo é realizado por meio da técnica proposta pelo INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), de posicionamento relativo estático-rápido, com o GNSS (Sistema de Navegação Global por Satélite), com dois receptores geodésicos (receptores capazes de diminuir o erro das coordenadas) de dupla frequência (L1 e L2). Um dos receptores, para transportar as coordenadas, é proveniente da Estação de Cuiabá - MT instalada no INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), de onde partirão os processamentos para os vértices de referência das nascentes. As coordenadas geodésicas, obtidas por meio do posicionamento relativo estático-rápido, são coletadas dentro de um raio de 20 km da Estação de Cuiabá-MT, por 60 minutos em cada nascente.

Procedimento de instalação de marco

Para a obtenção das coordenadas geodésicas -  latitude, longitude, altitude e as coordenadas do sistema UTM (Universal Transversa de Mercator) E= Leste e N= Norte, DATUM SIRGAS 2000 -, utiliza-se o software de processamento Topcon Tools ou MAGNET Tools. Para a transformação das coordenadas de altitude elipsoidal1 em altitude ortométrica2 utiliza-se o programa Map Geo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), com o qual será obtida a ondulação geoidal.

1Distância vertical de um ponto a um elipsoide (aproximação da forma irregular da Terra) de referência.
2Distância vertical de um ponto, situado sobre a superfície terrestre, em relação a um geoide (nível médio do mar) de referência.

Hidrogeologia

Análises de solo

Os solos são analisados macroscopicamente em laboratório. Para características texturais é utilizado protocolo padrão proposto pela Embrapa. Para a identificação de solos hidromórficos é utilizada a Carta de Munsell.

carta de Munsell

Posicionamento do nível do lençol freático

Um poço de monitoramento é instalado a montante de cada nascente, para identificar o nível freático e coletar amostras de água para análises físico-químicas. O nível d'água no poço é monitorado mensalmente com o medidor de nível d’água modelo HSNA-300.

Análises de água

A qualidade da água subterrânea é mensurada por meio dos parâmetros pH, sólidos, magnésio, fosfato total, dureza total, condutividade elétrica, cálcio, alcalinidade e inorgânicos, analisados no Laboratório de Análise de Água, Efluentes e Consultoria Ambiental Hidro-Análise, localizado em Cuiabá. Os parâmetros de temperatura do ar e da amostra, pH, cloro residual e total são medidos em campo. Análises isotópicas de oxigênio 18, deutério e trítio são realizadas no Centro de Isótopos Estáveis, na Universidade Estadual Paulista Júlio Mesquita Filho – UNESP, campus Botucatu, São Paulo.

Fauna

Levantamento faunístico

O levantamento é realizado pelo método de procura ativa no entorno das nascentes (raio de 50m). As amostragens estão direcionadas para répteis e anfíbios (considerando a especialidade do grupo de pesquisadores). Registros de representantes de outros grupos zoológicos (por exemplo: invertebrados, aves, mamíferos) são oportunísticos.  A partr da observação são identificadas as espécies. Em cada nascente é analisado o índice de diversidade (Margaleff).

Procura ativa noturna de fauna

Análises de água

A qualidade da água é mensurada por meio dos parâmetros: pH, condutividade elétrica, oxigênio dissolvido, fósforo total, nitrato, sólidos totais, sólidos totais dissolvidos, sólidos suspensos, DBO (Demanda Bioquímica de Oxigênio), DQO (Demanda Química de Oxigênio), nitrogênio amoniacal total, óleos e graxas, coliformes totais e Escherichia coli. As amostras são analisadas no Laboratório de Análise de Água, Efluentes e Consultoria Ambiental Hidro-Análise, localizado em Cuiabá. Os parâmetros de temperatura do ar e da água são medidos em campo. Em cada nascente é calculado o Índice de Qualidade das Águas (IQA), no qual os valores são classificados em faixas:

Ótima           91 - 100
Boa              71 - 90
Razoável       51 - 70
Ruim            26 - 50
Péssima        0 - 25

Vegetação

Mapeamento da vegetação

A vegetação é mapeada a partir de imagens capturadas por uma câmera de alta resolução acoplada ao veículo aéreo não tripulado (VANT). Essas imagens são pré-processadas envolvendo a ortorretificação e construção de mosaicos de imagens. A vegetação é classificada pelo método de Randon Forest associado à análise de textura. Dessa forma, são avaliados os números digitais de RGB e as medidas de textura das imagens capturadas, em diferentes escalas.

Modelo Digital de Elevação (MDE)

É obtido por levantamento aéreo realizado por sensores de tecnologia LIDAR (Radar Lidar) acoplados em um VANT. Os dados de elevação LIDAR são utilizados para mapear com precisão a distribuição potencial e estática das áreas úmidas.

Exemplo do delineamento de área úmida utilizando sensor LIDAR

Levantamento qualitativo da vegetação

É realizado nas diferentes cotas de elevação geradas pelos modelos digitais de elevação. As espécies são classificadas de acordo com sua “afinidade” com a inundação. As espécies identificadas recebem as seguintes classificações:

  • Planta obrigatória de AUs – quase sempre ocorre em áreas úmidas (probabilidade estimada > 99%) em condições naturais;
  • Planta facultativa de AUs – normalmente ocorre em áreas úmidas (probabilidade estimada 67% – 99%), porém ocasionalmente ocorre em ambientes exclusivamente terrestres;
  • Planta facultativa – igualmente provável de ocorrer em zonas úmidas (probabilidade estimada 34% – 66%);
  • Planta facultativa de áreas altas – usualmente ocorre em áreas altas (probabilidade estimada 67% – 99%), mas ocasionalmente ocorre em áreas úmidas (probabilidade estimada 1% - 33%);
  • Planta obrigatória de áreas altas – ocorre quase sempre (probabilidade estimada > 99%) em áreas altas.

Rhynchanthera dicotoma - MELASTOMATACEAE, um exemplo de plantas obrigatória de Área Úmida

Classificação das áreas úmidas

Segue sistemas hierárquicos já conhecidos, considerando as características hidrogeológicas, as condições edáficas e os grupos de plantas presentes.

Inventário da vegetação

São identificadas as espécies da vegetação (árvores, arbustos, subarbustos, ervas, epífitas e pteridófitas) que ocorrem no entorno da nascente (raio de 50 m). As espécies que se encontrarem em estágio reprodutivo (flores, frutos e esporos) são coletadas e levadas para herborização em laboratório.

Será elaborado um guia de campo para a identificação de plantas indicadoras de nascentes e áreas úmidas. Será desenvolvido, em parceria com especialistas em tecnologia da informação, um aplicativo mobile que facilitará a identificação taxonômica das plantas indicadoras de nascentes e áreas úmidas urbanas.

 

VIDEOS DE INSPEÇÃO

A metodologia adotada para os vídeos de inspeção baseou-se na automatização do processo de captura das imagens, eliminando interpretação do piloto e garantindo o padrão e embasamento técnico do vídeo.
Utilizando software de computador, cria-se o plano de voo para que um VANT realize um trajeto padrão para todas as nascentes, com a câmera apontada exatamente para a região das coordenadas fornecidas pela equipe de campo e importadas no sistema.

Esquema do plano de voo para cada nascente